O sistema de comunicações viárias terrestres foi um elemento estruturante da expansão e consolidação do poder de Roma.
Para o Noroeste da Península Ibérica, a rede viária imperial foi pensada, num primeiro momento, com um claro objetivo estratégico e militar, visando articular o triângulo das novas cidades augustas, Bracara, Asturica e Lucus (Braga, Astorga e Lugo). Num segundo momento, garantida a pacificação do território e orientando-se sobretudo para a organização administrativa do Império, as vias tornaram-se rapidamente na espinha dorsal da gestão de um amplo espaço económico e social, que acabaria por se tornar, pela primeira vez na História, verdadeiramente pan-europeu. O sistema viário romano não só possibilitou a existência de um quadro económico, administrativo e fiscal comum, como se tornou símbolo imemorial do poder do Império, desenhando um mundo onde todos os caminhos acabariam por ir dar a Roma.
A Geira é um dos mais importantes troços conservados dessa vasta rede viária. O projeto de construção iniciou-se com Vespasiano e foi concluído por Tito e Domiciano, aproximadamente no ano 80 da nossa era, conforme testemunham cinco dos inúmeros miliários documentados, que mencionam expressamente VIA NOVA FACTA ou só VIA NOVA, registando também que foram dedicados por Gaius Calpetanus Rantius Quirinalis Valerius Festus, um importante aliado de Vespasiano na crise sucessória de 68-69 d.C., tendo sido cônsul sufecto do senado romano em 71 e legado imperial do Convento Bracaraugustano entre 78 e 80 d.C.
A permanência de um personagem político com este grau de proximidade à cúpula imperial denota a importância dada por Vespasiano ao desenvolvimento desta região da Península Ibérica, numa fase em que esta região já se encontrava pacificada e com estatuto de direito latino desde 74 d.C. A concessão do direito latino à Hispânia, realizada pela primeira vez fora da Península Itálica, terá significado a elevação das cidades peregrinas a municipalidades de direito latino, possibilitando o acesso das elites locais à cidadania romana e ao correspondente exercício de magistraturas até então reservadas aos municípios da Península Itálica.
A construção da Geira surge, portanto, num contexto geral de paz e prosperidade, em que a reforma administrativa da Hispânia, agora com estatuto provincial privilegiado, proporcionou um quadro de estabilidade política e social com expressão efetiva no desenvolvimento das economias locais e na fundação de novas cidades.
Foi assim que, durante a dinastia flaviana, cresceram exponencialmente os centros económicos da Península Ibérica: desde o funcionamento em pleno dos centros de exploração mineira, a novos polos de produção agrícola ou a centros de produção oleira, a Hispânia rapidamente se tornou numa província nevrálgica no contexto da economia imperial.
A Geira surge, simultaneamente, como antevisão e consequência deste crescimento económico exponencial e depressa atinge destaque como via privilegiada para o funcionamento da economia local e como eixo privilegiado para a circulação e afirmação de ideias e de ideais da romanidade no contexto específico da identidade cultural do Noroeste peninsular.
O reforço da ligação entre as duas capitais conventuais, acrescentando uma nova via aos três itinerários já existentes, traduz a importância do circuito económico entre estes centros urbanos. Pela Via Nova chegava-se também a outros centros urbanos e rurais que se distribuíam ao longo do seu percurso, como Aquae Quaerquenae, Aquis Geminis ou Bergidum. Todos estes núcleos se desenvolveram com o estabelecimento de estações de paragem ou mansiones.
A Via Nova servirá, a partir de finais do séc. I, o escoamento de importantes centros mineiros do Noroeste, nomeadamente os do Vale do Sil, já nas imediações de Asturica Augusta e, a aceitar as informações das Tabulas de Astorga, também os do Vale do Terva, junto a Aquae Flaviae.
A Via Nova terá também servido, certamente, como eixo dinamizador de outros polos económicos: poderão os territórios da Geira, nas faldas da serra Amarela e da serra do Gerês, ter sido centros de produção de mel e cera ou de fornecimento de madeiras, quer para construção, quer para combustível lenhoso, no contexto do convento bracaraugustano? Estas duas atividades foram seguramente fontes de rendimento para as populações locais séculos mais tarde, e ainda hoje possuem um peso considerável na balança económica da região. Poderá ser que a preponderância tradicional destas atividades seja uma herança de época romana?




